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            Chegou ao fim nesta segunda-feira uma das mais brilhantes carreiras da   história do futebol. Aos 34 anos, Ronaldo não resistiu à intensa batalha diária   contra os desgastes físicos acarretados pelas oito cirurgias ao longo da sua   trajetória, relembrou um problema de hipotireoidismo e anunciou que não jogará   mais profissionalmente. É o fim para aquele que eternizou a camisa 9 com um   talento que, não por acaso, lhe rendeu o apelido de Fenômeno e se transformou em   um mito mundial. 
           - Estou aqui para falar que estou encerrando a carreira como jogador   profissional. E dizer que essa carreira foi linda, maravilhosa e emocionante -   declarou Ronaldo, ao abrir o seu emocionante pronunciamento. 
           Em uma concorrida entrevista coletiva no CT Joaquim Grava, em São Paulo, o   craque comunicou, exatamente às 13h02m, que não continuará atuando pelo   Corinthians, clube com o qual tinha contrato até 31 de dezembro de 2011. Ronaldo   assombrou o planeta aliando velocidade e técnica de forma nunca vista antes, mas   sucumbiu ao tempo e ao próprio corpo. Agora, se dedicará à família, à vida de   empresário, a um projeto social e à fortuna que acumulou sendo um gênio da   bola. 
           Ronaldo chegou ao centro de treinamento às 10h30m, acompanhado de dois dos   seus quatro filhos -  Ronald e Alex. Vestido com traje casual, caminhou até o   gramado onde os outros jogadores treinavam e parou a atividade. Por cerca de   cinco minutos, discursou para companheiros, membros da comissão técnica e   diretoria. No fim, todos o aplaudiram de pé e o abraçaram em uma cena comovente,   que representa bem o respeito que todos têm por ele. 
           Até a hora do anúncio oficial, o Fenômeno ficou nas dependências internas do   CT se despedindo de funcionários e outros colegas. A cada adeus, a emoção tomava   conta do jogador. 
           Ao explicar os motivos por ter antecipado o seu adeus, Ronaldo justificou   usando dois fatores: o hipotireoidismo e as constantes dores. 
           - Todos sabem do meu histórico de lesões. Tenho tido, nos últimos anos, uma   sequência de lesões que vão de um lado para o outro, de uma perna para a outra,   de um músculo para o outro. Essas dores me fizeram antecipar o fim da minha   carreira. Além disso, há quatro anos eu descobri, quando estava no Milan, que   sofria de hipotireoidismo. É um distúrbio que desacelera o metabolismo e que,   para controlá-lo, é necessário tomar alguns hormônios proibidos no futebol, por   poder acusar doping. Imagino que muitos devam estar arrependidos por terem feito   chacota sobre o meu peso, mas eu não guardo mágoa de ninguém. 
           O pronunciamento, que durou 45 minutos, foi recheado de emoção. Por diversas   vezes, o craque precisou parar de falar para se concentrar e segurar as   lágrimas. Várias partes do seu discurso foram pausadas, com interrupções para   que pudesse respirar mais fundo. Num papel ele trazia algumas palavras que   ensaiou em casa na noite passada, mas teve muita dificuldade em seguir o script.   Ronaldo não conseguiu... e chorou. 
           - Foi uma carreira linda, vitoriosa, emocionante... Tive muitas derrotas,   infinitas vitórias, fiz amigos e não lembro de ter feito um inimigo. Tenho   muitos agradecimentos a fazer. A todos os clubes em que passei: São Cristóvão,   Cruzeiro, PSV, Barcelona, Inter de Milão, Real Madrid, Milan... O Corinthians eu   agradecerei logo mais. Quero agradecer a todos os jogadores que atuaram comigo e   aqueles que jogaram contra, aos que foram leais e aos que foram desleais também.   Agradecer aos treinadores com os quais tive boa relação e aos que eu tive   divergências. E também agradecer aos patrocinadores que sempre acreditaram em   mim. 
           Para se distrair e tentar não deixar as lágrimas escorrerem, Ronaldo   rabiscava um pedaço de papel, postava comentários no Twitter e brincava com os   filhos, que estavam sentados numa cadeira ao lado. Alex, o caçula de 5 anos,   chegou a se esconder embaixo da bancada, arrancando risadas do pai. Como   prometido, o Corinthians teve um capítulo especial na hora do seu adeus. 
           - Tudo começou com um café da manhã com o presidente Andrés Sanches no Rio de   Janeiro. Acreditei no projeto, demos um aperto de mão e eu falei para ele "pode   trazer o contrato que eu assino até em branco se precisar". 
           Ronaldo foi apresentado como reforço do Corinthians em dezembro de 2008. Era   o principal nome do projeto de reconstrução do clube, que acabava de voltar de   um doloroso rebaixamento à Série B do Campeonato Brasileiro, quando jogou a   Segunda Divisão e retornava à elite. Pelo Timão, Ronaldo esteve em campo 69   vezes, marcou 35 gols e ganhou dois títulos em 2009: o Paulistão e a Copa do   Brasil. 
           A perda de duas Libertadores, 2010 e 2011, foram os seus piores momentos. A   última, inclusive, culminou numa reação violenta de parte da torcida. No retorno   da Colômbia, onde o time foi eliminado ainda na primeira fase, o ônibus da   delegação foi apedrejado, os atletas foram insultados e os muros do clube   acabaram pichados. Ronaldo, claro, foi o principal alvo. 
           - Tenho de fazer meu agredecimento a todos os brasileiros que choraram comigo   quando eu chorei e que caíram comigo quando eu caí. Mas, dessa torcida   brasileira toda, eu quero agradecer a do Corinthians. Nunca vi uma torcida tão   vibrante, tão apaixonada e tão entregue ao seu time de futebol. É certo que em   algumas vezes essa cobrança por resultado a torna agressiva e fora do controle.   Mas eu não me imaginava viver sem o Corinthians. Agradeço ao Andrés, que é meu   irmão, e digo que continuarei ligado ao clube da maneira que ele quiser. Muitas   vezes vocês vão me encontrar torcendo pelo Corinthians no estádio. Aproveito e   peço desculpas publicamente pelo fracasso no trajeto da Libertadores. 
           Ao longo da carreira, ele balançou as redes 475 vezes, contando as passagens   por Cruzeiro, PSV, Barcelona, Inter de Milão, Real Madrid, Milan, Corinthians e   Seleção Brasileira. O Fenômeno foi também eleito três vezes o melhor jogador do   mundo pela Fifa e deixa o futebol com o status de maior artilheiros das Copas do   Mundo e com dois títulos da principal competição do planeta - em 1994 como   reserva e em 2002 como estrela. 
           Já na condição de ex-jogador, o Fenômeno tem planejado o que fará da sua   vida. Empresário, vai cuidar dos seus negócios. Em julho ele pretende reunir   amigos para uma despedida oficial. E, em breve, anunciará a criação de um   instituto social chamado "Criando Fenômenos". Acostumado a deixar para trás seus   adversários, Ronaldo encerra sua carreira por causa de um obstáculo bem mais   próximo, citado em uma frase emblemática: 
           - Perdi para o meu corpo. 
           Fonte: Globo Esporte  |